Foto: Osmar Bustos
Especialistas em cirurgia plástica, dermatologia, otorrinolaringologia e oftalmologia apresentaram e discutiram casos reais de procedimentos realizados por não médicos – que também foram analisados do ponto de vista jurídico e pericial –, durante a 3ª Conferência Estadual da Lei do Ato Médico, realizada pelo Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) no dia 13 de maio, em sua sede, com transmissão ao vivo pelo canal do Conselho no Youtube.
Pelo Cremesp, a mesa de abertura foi composta pela presidente Irene Abramovich; o diretor 1º secretário do Cremesp, Ângelo Vattimo; a diretora 2ª secretária, Maria Camila Lunardi; o procurador jurídico, Carlos Magno Michaelis; a conselheira Mirna Tamura, perita do INSS; e o coordenador da Câmara Técnica de Cardiologia do Conselho, conselheiro Silvio Sozinho Pereira, perito pelo Departamento de Perícias Médicas do Estado de São Paulo.
Como convidados para comentar os aspectos jurídicos e periciais dos casos, participaram o jurista, professor e procurador de Justiça do Ministério Público de São Paulo (licenciado), Fernando Capez; a promotora de Justiça e assessora do Centro de Apoio Operacional Criminal da Procuradoria Geral de Justiça de São Paulo, Daniela Fávaro, representando o Ministério Público (MP); Frederick Wassef, advogado criminalista; e o médico Alexandre Kataoka, do Instituto de Medicina Social e Criminologia do Estado de São Paulo (IMESC) e diretor do Departamento de Defesa Profissional da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, que também apresentou um caso clínico.
“A Comissão de Defesa do Ato Médico que criamos nessa gestão tem sido muito criativa no em suas atividades de combate à invasão da Medicina por outras áreas, a exemplo dessa conferência que realizamos. Não se trata de uma atitude corporativa, mas de conscientização da população para que aprendam a distinguir quem é médico e quem não é, e ver se o profissional tem especialidade para aquilo que vai realizar”, comentou a presidente Irene.
“De fato temos uma comissão muito atuante junto ao MP e aos Conselhos dos que não são médicos desde o início da gestão. Fizemos uma campanha massiva sobre o Ato Médico em defesa da boa Medicina, que não é corporativa. Ela vai direto ao escopo da criação da lei dos Conselhos, que é a defesa da sociedade. Estamos cumprindo o nosso papel”, afirmou Vattimo.
“Ninguém está aqui defendendo interesses de determinada classe. No decorrer dessa conferência, veremos as consequências da inobservância do que será dito aqui. Estamos falando sobre vida, sobre o compromisso do médico em seu juramento, e as consequências, criminais e administrativas, quando não é o médico que exerce a Medicina”, alertou Capez.
“É muito importante a presença de médicos peritos, pois ele é a parte da Medicina com a qual temos mais contato. É ele que vai nos dar o subsídio para entrar com ação quando ocorre um erro médico cometido por pessoas de outras áreas ,e que pode resultar em danos gravíssimos para a sociedade”, pontuou Daniela.
Ao apresentar a dinâmica dos trabalhos do ponto de vista médico, jurídico e pericial, Michaelis ressaltou a importância da conferência, “que eleva a Medicina do Estado de SP a outro patamar”, ao reunir quatro especialidades médicas afetadas pela transgressão do ato médico, que impacta diversas frentes na saúde pública e privada. “Elas estão reunidas no mesmo lado da mesa, numa demonstração robusta da constituição do vínculo harmônico inédito entre elas, promovido pelo Cremesp”, destacou.
Cirurgia Plástica
Na primeira apresentação de caso, feita por Kataoka, foi discutida a indicação incorreta de preenchimento por odontólogo, tendo como mediadores do debate de Irene e Vattimo, com comentários dos debatedores especialistas Rebecca Rossener, cirurgiã plástica e membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica; e Meire Parada, dermatologista e membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Dermatológica; com análise pericial por Mirna e Pereira, e jurídica, de Wassef.
Meire comentou que quando se recebe paciente no consultório para preenchimento, é necessária análise clínica e solicitação de ultrassom para ver se o paciente tem aplicação prévia. “Toda vez que o paciente tem preenchimento já feito, é mandatório que se analise que tipo de material é esse, começando com a realização de ultrassom para fazer o mapeamento da face”, orientou.
“Cirurgicamente, é muito difícil retirar o material, é um processo inflamatório agudo e crônico, algo permanente, e, ao longo do tempo o material acaba se infiltrando mais, piorando o quadro”, comentou Rebeca.
“O médico deveria ter uma maneira de declarar como recebeu a paciente, porque, depois, não consegue se defender da culpa que lhe será imputada. Poderia ser uma espécie de formulário de notificação compulsória de procedimentos mal sucedidos, sugeriu Irene.
“A nossa comissão do ato médico pode ser um canal para a criação de um fluxo de encaminhamento de casos ao MP”, complementou Vattimo. “Tendo essa documentação no prontuário médico para envio aos peritos, será muito importante para efetuar a análise”, reforçou.
Mirna lembrou a responsabilidade do perito nessa hora, “que tem de fazer a interface entre o que de fato aconteceu e o que será apresentado ao juiz”.
Pereira comentou a importância da função do médico perito auxiliar do juiz, que tem domínio da legislação, e do assistente técnico. “O caso tem de ser encaminhado para análise, por perícia direta ou por encaminhamento de material; e ter exames que comprovem que houve um dano, avaliando a relação entre a ação e o dano causado e julgando se o dano é total ou parcial.”
Wassef destacou a importância da atuação do Ministério Público junto com o Cremesp na defesa da integridade física, da vida humana. “Nenhum outro bem é mais precioso, e é isso o que está em jogo aqui, essa é a pauta do ato médico. Como brasileiro, digo a todos os médicos: vocês têm o dever, a obrigação ética e moral, e até religiosa, de se unirem em defesa do Ato Médico. Hoje, isso é uma questão de vida e morte. Vivemos uma explosão de mortes. A sociedade não pode minimizar ou flexibilizar o que está acontecendo”, alertou.
A promotora Daniela acrescentou que, do ponto de vista jurídico, tudo depende muito da documentação e da perícia. “Quando o médico recebe o paciente assim, deve fazer um prontuário para comunicar esses danos ao médico perito, que poderá analisar as fases dos procedimentos, diferenciando, na pratica, se houve uma falta de observância de normas técnicas ou imperícia ou negligência, saindo do campo da culpa para o dolo, o que aumenta substancialmente a pena.”
Dermatologia
A especialidade contou com palestra da médica dermatologista e especialista no tratamento das complicações em Cosmiatria, Maria Fernanda Tembra, com o tema “As Complicações de procedimentos estéticos por não médicos”. Ela trouxe casos de pacientes com complicações irreversíveis devido a aplicação de materiais injetáveis, com debate mediado por Irene e pelos médicos dermatologistas Eliandre Palermo e Sinarley Silva.
“Diante do aumento das demonizações faciais, temos visto cada vez mais deformações graves e hoje existem as desarmonizações faciais, quando o dano não é irreversível, mas apenas estético”, em relação a danos causados por excesso de preenchimentos, que estão disponíveis na internet, relatou Maria Fernanda. “Qualquer pessoa pode aprender as técnicas pelo youtube. Por isso, temos de estar preparados para acolher pacientes com danos importantes causados por injetáveis. E nos diferenciar como médicos, unidos para fazer o melhor por nossos pacientes.”
Oftalmologia
A médica oftalmologista e assistente colaboradora do setor de plástica ocular da Disciplina de Oftalmologia do HCFMUSP, Maria Antonieta Ginguerra, abordou o Processo inflamatório palpebral, com caso de paciente encaminhada da dermatologia devido a edema malar associado a alteração de cor de pele, por preenchimento de olheira, com produto desconhecido.
“Existem muitos artigos jurídicos que podem auxiliar os médicos no ativismo judicial, para tentar equacionar esses casos, pois eles enfrentam muitas dificuldades no combate a invasão da Medicina, comentou a médica dermatologista Juliana Caramel, de modo online. “Temos de chamar as empresas que comercializam esses produtos à responsabilidade, não só criminal como financeiramente também”, acrescentou Eliandre.
Otorrinolaringologia
Em sua apresentação, a médica otorrinolaringologista, Leila Freire, trouxe três casos, sob o tema “Rinomodelação definitiva: consequências do ato por não médico”, mostrando o manejo em pacientes que já passaram pelo procedimento de preenchimento nasal, com aplicação inadequada de produtos. Ela também comentou sobre a técnica que desenvolveu para redução da base nasal, última etapa da rinoplastia, sem comprometimento da função ou estético.
“Vemos muita complicação dos órgãos em casos de otorrinos e oftalmos. Pacientes que ficam cegos ou têm obstrução nasal, perda de audição”, alertou Maria Camila. “Eles vêm não só do ponto de vista estético, mas por um dano maior, do ponto de vista funcional. Em relação a isso, a perícia tem uma ação mais contundente. É preciso detalhar bem o dano feito antes do atendimento ao paciente. Enquanto não houver punição exemplar, nada irá mudar.”
Campanha do Ato Médico
Ao final, foi apresentado um vídeo da Campanha do Ato Médico do Cremesp. “Essa campanha é fantástica, vai direto ao foco e demonstra a importância do Ato Médico para o especialista, sugeri até uma parceria com as sociedades de especialidade, que devem ter a mesma atitude”, comentou Silva.
“Essa pauta é de saúde pública com importância para a segurança pública, é muito importante a comunicação, pois é chocante a quantidade de pessoas que estão morrendo”, comentou Wassef.
“Repliquei a campanha em todas as minhas redes sociais. Acho que essa comunicação é muito importante, pois existem pacientes que são leigos e ingênuos. A comunicação é o melhor processo para levar informação ao médico e à população”, comentou Juliana.
Na avaliação de Mirna é preciso estabelecer a diferenciação do médico. “Temos de mostrar para a população que ele é uma pessoa capacitada para efetuar os procedimentos. Mesmo como médicos, ao acolher os pacientes, precisamos conhecer nossos limites, para saber até onde se pode atuar, e, se necessário, encaminhá-los a um colega habilitado, evitando danos maiores”, orientou.
“Atos e procedimentos da Medicina realizados por não médicos têm levado a um grave problema de saúde pública, e temos de conter isso”, declarou Pereira.
“É uma função de todos nós, médicos, orientar a população em relação a procedimentos realizados por não médicos”, comentou Eliandra.
“Esse trabalho de conscientização é voltado não somente para os médicos. Temos também de capacitar toda a sociedade civil”, finalizou Michaelis.
Assista à íntegra da 3ª Conferência Estadual do Ato Médico pelo canal do Conselho no YouTube.
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